domingo, 9 de agosto de 2015

QUAL O SABOR DA LAMA?

NOTA DO BLOG: Vem à mente nesse momento uma ideia, um insight. Publicar no nosso blog Mutum Socialista uma série de reflexões de gente que a gente acredita serem sinceras em suas observações, denominada QUAL O SABOR DA LAMA?
Nada melhor que o texto de Rudá Ricci, sociólogo de Belo Horizonte, postado em sua página do facebook RUDÁ GUEDES RICCI para iniciar essa série.




QUANDO O PROBLEMA CHEGA À QUEDA DE LEGITIMIDADE

Legitimidade é o conceito básico da relação democrática. O voto é uma expressão popular das intenções e crenças do eleitor que legitima o eleito. Contudo, se o eleito foge deste consenso original, perde legitimidade como um asmático perde capacidade para absorver oxigênio. Conseguir obediência sem necessitar usar a força é um dos sinais do poder legítimo. Gerar consensos entre membros da sociedade e das forças políticas hegemônicas do país é outro sinal. Esta é a fonte da autoridade eleita.
A situação do governo Dilma é, neste sentido, desesperadora. Perdeu em um semestre o aval que o país lhe conferiu pelas urnas. Por qual motivo? Os dados recentes indicam que é reflexo do pacote econômico, que desde o início denominei de "suicida", que rompeu com toda a lógica do lulismo e, pior, com a promessa de campanha.
Dilma já se revelou, no primeiro mandato, incapaz de agregar. É tecnocrata e, assim, bateu de frente com a suposição de Max Weber sobre o perfil e a ética das lideranças políticas. Weber sustentava que, ao contrário da ética do cientista, o político não pode ser intransigente e defender ao limite sua verdade sob pena de se tornar tirano. A ética política democrática sugere transigir.
Dilma ficou famosa por ser intransigente e agressiva. Também é de conhecimento público que sob sua batuta, parte significativa do arco de alianças montado por Lula se desfez. O pacote econômico recessivo e monetarista foi a outra peça que desfez o jogo de varetas que estrutura a legitimidade do lulismo. Nordeste perde empregos e investimentos. Os pobres compram menos. Os assalariados perdem empregos.
Para piorar a situação, em seis meses, a direção nacional do PT se revelou impotente e não conseguiu criar um fato político positivo. O arremedo de encontro nacional em Salvador prometia algo de novo e terminou melancólico, com mais do mesmo.
O governo Dilma foi se paralisando, como que tomado por pânico, abrindo mais e mais espaço para Michel Temer até que se forjou um consenso exógeno ao governo de que o vice-Presidente da República era mais talhado que a titular. Jornalões e federações empresariais poderosas sinalizaram o consenso. Mas não ficou por aí. Frei Betto e Valter Pomar produziram entrevistas e ensaios em que ficou nítido que a hora de baixar a bola parecia ter chegado.
A deslegitimação acelerada abriu espaço para aventureiros. E eles já começam a ser nomeados pelos atores que citei acima. Citam Eduardo Cunha, mas também Aécio Neves. Por motivos diferentes, esses dois personagens oposicionistas jogam suas fichas num desfecho dramático em relação ao governo, pouco se importando com a estabilidade do país. Um, parece ferido por não ser blindado das investigações da Operação Lava Jato. Outro, sabe que em caso de eleição antecipada, seu nome ainda estará fresco na memória do eleitor como o último candidato que enfrentou Dilma Rousseff. O tempo de ambos está se esgotando. Passado este semestre, é provável que mergulhem no ostracismo. Cunha poderá ser alvejado em pleno início de voo. Aécio cederá lugar ao governador paulista, aliás, o verdadeiro artífice de sua ida ao segundo turno das eleições do ano passado, já que em terras mineiras, o senador mineiro foi três vezes derrotado pelas urnas.
Para debelar a aventura golpista, o PT terá que ceder. A questão é: o que ceder? As especulações são muitas e várias "demandas" já foram apresentadas. O governo, mais uma vez, reage (nunca se antecipa) e "vaza" nomes de uma possível reforma ministerial se arriscando ao isolamento profundo, caso tais indicados recusem esta possibilidade publicamente.
O tempo parece curto, mas os indícios parecem apontar para um acordo geral, um pacto de estabilidade política, tendo Michel Temer como o fiel da balança. O PT terá que ceder. Em quatro anos, perdeu todo capital que conseguiu construir em décadas ou, para não ser tão catastrófico, que construiu ao longo dos governos Lula.