Carta da XXI Assembleia da CPT\MG: no campo e na cidade,
luta pela terra e pelas águas, para além do capital.
Nós, agentes de pastoral da CPT, camponeses e camponesas,
reunidos/as no distrito de Belisário, município de Muriaé, na Zona da Mata
Mineira, dias 26, 27 e 28 de agosto de 2016, realizamos a XXI Assembleia
Estadual da Comissão Pastoral da Terra (CPT\MG), com a participação de 52
agentes de pastoral da CPT e representantes do campesinato – quilombolas, Sem
Terra, Sem Casa, acampados, assentados, comunidades tradicionais (geraizeiros,
indígenas, posseiros, vazanteiros, pescadores) e atingidos por barragens.
Tivemos uma participação marcante de jovens e de mulheres que nos alertaram que
relações de gênero sem machismo devem orientar nossas relações humanas. Fomos
graciosamente acolhidos/as pelo povo de Belisário da Paróquia Santo Antônio,
pelo Frei Gilberto Teixeira (FSMA) e por muitas famílias que abriram portas e
corações para nos hospedar.
Com o tema No campo e na cidade, luta pela terra e pelas
águas, para além do capital e o lema “Os clamores das filhas e filhos da terra
e das águas chegaram até mim” (Êxodo 3,9), avaliamos os rumos da CPT/MG e renovamos
nossa fé no Deus dos pobres e nos pobres de Deus e nossa convicção na caminhada
libertadora, comprometidos/as com os pobres do campo e da cidade, seguindo os
passos de Jesus de Nazaré do seu
Evangelho.
Foram dias de intensa convivência, de celebração, de troca
de experiências e de discussão entre os\as agentes da CPT/MG, camponesas e
camponeses de todas as regiões de Minas Gerais. Sábado à noite na Igreja de
Santo Antônio, com a comunidade católica de Belisário, celebramos os 40 anos da
CPT no Brasil e fizemos memória de Alvimar Ribeiro dos Santos, “o Alvimar da
CPT”, nosso irmão, pai, mestre e profeta, que partiu para a vida em plenitude
dia 19 de agosto último. Depois, em uma calorosa noite cultural, muitas pessoas
lutadoras da zona da Mata e de Minas Gerais foram homenageadas e incentivadas a
continuar aguerridas na luta pela construção de uma sociedade justa, solidária
e sustentável.
Alegramo-nos com tantas lutas por direitos sociais e
ambientais na zona da Mata, região de minifúndios, de agricultura familiar
agroecológica e cooperativas. Através da Campanha das Águas contra o Mineroduto
da Mineradora Ferros a luta popular conquistou a interrupção do licenciamento
ambiental, mas a luta continua, pois os interesses da mineradora permanecem.
Reafirmamos nossa presença solidária junto aos camponeses e
camponesas no processo de luta pela terra e por uma Reforma Agrária Popular,
tão necessária e urgente, frente à reconcentrada estrutura agrária brasileira,
em que o agronegócio e outros projetos do capital causam tanta destruição e
injustiça socioambiental. Neste sentido, continuaremos com o apoio às
comunidades e povos tradicionais que, em processos de luta e retomada de seus
territórios ancestrais, reafirmam suas identidades no caminho do Bem Viver, que
prima pela felicidade compartilhada no respeito a todas as dimensões da vida.
Renovamos nosso compromisso com as populações do campo, da
floresta e das águas que enfrentam os grandes projetos que visam apenas o lucro
e causam morte: mineração, grandes barragens, agronegócio e monoculturas,
projetos que propagam progresso para alguns e devastação socioambiental para a
maioria, projetos que expropriam comunidades e sacrificam a biodiversidade da
vida. Na cidade, continuaremos ao lado de todos que lutam contra a especulação
imobiliária e os projetos de cidades empresas e, assim, lutando por cidades que
caibam todos e todas, com direitos sociais respeitados.
Denunciamos o processo de impeachment da Presidenta da
República Dilma Rousseff como golpe político, parlamentar judicial e midiático,
uma vez que não há suficiente comprovação de crime de responsabilidade. Não
reconhecemos o governo interino e ilegítimo de Michel Temer e denunciamos suas
políticas neoliberais de gravíssimos cortes de direitos sociais. As classes
trabalhadoras do campo e da cidade, mais uma vez, estão sendo sacrificadas na
reciclagem do sistema do capital.
Indignados, repudiamos e denunciamos:
- as ações da mineradora Rio Pomba, que em 2006 e 2007, com
dois rompimentos criminosos de uma barragem causou devastação socioambiental no
rio Muriaé em dez municípios e até hoje não indenizou de forma justa todas as
famílias atingidas. Somente nos municípios de Miraí e Muriaé mais de 12 mil
famílias foram golpeadas pela lama da mineradora Rio Pomba. A mineradora CBA –
Companhia Brasileira de Alumínio -, do grupo Votorantim, na região da Zona da
Mata mineira desde 1993 minerando bauxita, com uma grande barragem de rejeitos,
e insiste em ampliar a mineração inclusive para dentro do Parque Estadual Serra
do Brigadeiro (PESB), o que é inadmissível. A mineradora Yamana Gold está
causando uma imensa devastação socioambiental na região Norte de Minas, em
Riacho dos Machados. A mineradora Vale obteve junto ao Governo de Minas
licenciamento ambiental obsceno, execrável e repugnante para construir a
Barragem Maravilhas III, na região metropolitana de Belo Horizonte. Após o
crime hediondo da Samarco\VALE\BHP, em Mariana, em 05 de novembro de 2015, que
matou 19 pessoas e sacrificou o rio Doce com lama tóxica, é injustiça que clama
aos céus o Governo de Minas, do PT, e Assembleia Legislativa terem aprovado
Projeto de Lei flexibilizando ainda mais os licenciamentos ambientais.
Denunciamos o conluio do Estado com as mineradoras e com as empresas do
agronegócio em Minas Gerais.
- O caos hídrico em muitas regiões de Minas já se instalou.
Após o secamento de lagoas, córregos e rios e milhares de nascentes, quem pode
está recorrendo a poços artesianos que, inclusive, estão secando após alguns
anos de uso.
- O projeto Jaíba, além de ter matado o rio Verde Grande,
não paga energia como paga outras empresas e a população.
Com a bênção do Deus da vida, com a presença espiritual e
profética de Rosa Maria Fortini e Alvimar Ribeiro dos Santos, valorosos
companheiros que nos deixaram fisicamente, mas continuam presentes em nós de
muitas formas, com as energias inspiradoras da XXI Assembleia da CPT\MG nos
despedimos para continuar na luta ao lado das camponesas e dos camponeses de
Minas Gerais e do Brasil, em um período que se anuncia ainda mais adverso aos
direitos humanos fundamentais e sociais. Com a força de Jesus ressuscitado,
vencedor das forças da morte, havemos de vencer. Essa é nossa fé, nossa
esperança e nosso compromisso.
Belizário, Muriaé, zona da Mata mineira, 28 de agosto de
2016.