QUARTA-FEIRA, 19 DE MAIO DE 2010
Por que as negociações com o governo emperraram?
Antes da Assembléia do dai 18, na escadaria da Igreja Matriz Nossa Senhora de Lourdes, a companheira Divina carregava a imagem de Nossa Senhora de Fátima. A passeata em BH terminou na Igreja São José. Nem com a ajuda de todos os santos o governo Aécio-Anastasia tem se sensibilizado com a realidade dos educadores. (Foto de Janaina)
Quem viu, ouviu ou leu o noticiário do dia 19, após o governo e a imprensa terem descoberto que a greve dos educadores não acabou, deve ter pensado que o Governo de Minas queria negociar e atender as reivindicações dos trabalhadores em greve. E que a direção sindical não encaminhou os termos das negociações para as bases. E que o governo, mesmo tendo atendido o que o sindicato exigiu, foi pego de surpresa com a manutenção da greve. E que as bases dos trabalhadores estão sendo enganadas. É este o relato que se retira da fala do Governo de Minas. Mas, será que as coisas são assim mesmo? Vamos analisar os fatos.
No dia 12 de maio, Governo e Sind-UTE reuniram-se na Assembléia Legislativa. Da reunião teria saído um acordo com três pontos: a não demissão dos grevistas, o não corte do ponto dos dias parados e a formação de uma comissão entre governo e sindicato para "revisar" as carreiras. A direção sindical teria que enviar uma proposta formalizando os termos deste acordo e o governo devolveria por escrito dizendo que aceitava cada um dos pontos.
Mas, no dia seguinte após a reunião mencionada, o site da SEE-MG divulgou comunicado dizendo que o pagamento do corte dos dias ocorreria na medida em que as aulas fossem repostas. Já era uma mudança em relação ao acordo feito. Segundo a própria secretária Renata Vilhena, uma folha extra seria gerada para pagar os dias cortados, mediante apresentação de um calendário de reposição.
É preciso aqui que se diga, de modo construtivo: tomada pela pressão em relação aos riscos e rumores de demissão, a direção sindical precipitou-se em aceitar a formação de uma comissão para estudar a incorporação de gratificações, sem que estivessem estabelecidos os critérios essenciais prévios para tal negociação. Além disso, errou também quando não divulgou imediatamente, para toda a base, os termos da negociação, como fez agora, após a assembléia do dia 18.
Mas, de qualquer forma, a direção sindical comunicou os detalhes da mencionada reunião com o governo para o Comando de Greve no dia 14, em reunião extraoridinária, e em seguida encaminhou para o governo uma proposta contendo: a) a não demissão dos educadores em greve, b) o pagamento dos dias parados em folha extra, e c) a formação de uma comissão paritária governo/representantes dos trabalhadores. Esta comissão teria 20 dias para apresentar resultados da incorporação das gratificações e mais 10 dias para enviar um projeto de lei para a ALMG. O fim da greve era parte dos termos enviados pelo sindicato.
Os termos de uma negociação para enrolar
Neste ponto, é preciso que se diga, a direção sindical extrapolou do seu papel, pois não poderia enviar um documento ao governo propondo o fim da greve com termos que não haviam sido apreciados pela categoria - ainda que a intenção da direção sindical fosse a melhor, voltada para aproximar a conquista do piso salarial profissional. Se o governo tivesse aceitado todos os termos propostos, nesta hora a direção sindical estaria de saia justa para continuar negociando com o governo.
Mas, o governo não aceitou sequer os termos que, segundo a direção sindical, haviam sido discutidos na reunião do dia 12. Na primeira proposta que enviou ao sindicato, formalizando seu compromisso por escrito, o governo previa o pagamento do corte apenas na medida em que as aulas fossem repostas; mantinha a não demissão; mas, sobre a comissão de negociação, o governo defendeu que ela tivesse alguns representantes dos trabalhadores - e não paritária (meio a meio) como defendia o sindicato. Além disso, a comissão teria 60 dias para produzir resultados e mais 10 para encaminhá-los à ALMG, data que seguramente já teria ultrapassado qualquer possibilidade de revisão salarial para este ano.
Diante da recusa deste documento do governo pela Assembléia dos educadores - documento este que o sindicato recebeu às 13 horas do dia 18, portanto, uma hora antes da assembléia -, o governo enviou um segundo documento. Na verdade, com poucas alterações. Mantinha a não demissão dos servidores em greve. Quanto ao pagamento dos dias parados, houve uma pequena melhora: ocorreria em folha suplementar assim que as escolas enviassem os calendários de reposição das aulas e estes fossem aprovadas pela SRE. No tocante à comissão de negociação, o prazo foi encolhido para 30 dias, mais 10 dias para enviar um projeto de lei à ALMG. Se esta comissão tivesse início, por exemplo, no dia 20 de maio (o que era pouco provável) ela produziria resultados no dia 20 de junho e o projeto chegaria à ALMG até o dia 30 de junho, data-limite para qualquer alteração do piso salarial. Além disso, o governo manteve a não-paridade na formação da comissão.
De qualquer forma, ainda que o governo tivesse atendido todas os termos propostos pela direção sindical, como havia condicionado o retorno ao trabalho para a eficácia das propostas, muito provavelmente ele seria surpreendido pela força da assembléia do dia 18, que mandou um recado claro: sem proposta concreta de aumento de salário, não há como recuar.
Premissas para a negociação
O governo já teve tempo de sobra, tanto nos sete anos e meio de governo Aécio-Anastasia, quanto nos 40 dias de greve, para elaborar propostas de alteração na chamada engenharia das carreiras e apresentar estas alterações para apreciação dos trabalhadores. Querer agora que seja feito em 20 ou 30 dias o que ele não fez neste tempo todo cheira a enrolação, a querer ganhar tempo para inviabilizar qualquer aumento salarial ainda este ano.
Por outro lado, a direção sindical não pode cair neste jogo. Dos três pontos que temos falado insistentemente neste blog, dois são de fácil solução por parte do governo: a não demissão dos grevistas e o pagamento antecipado da reposião mediante apresentação de um calendário de reposição. O terceiro ponto, que é a questão salarial, não pode fugir de maneira alguma da lógica defendida pela categoria do piso profissional. Neste caso, o piso como salário base considerando os critérios da jornada de 24 horas para o professor com ensino médio, servindo de referência para as demais tabelas salariais.
A categoria, acredito eu, estaria até disposta a discutir valores deste piso, entre aquele valor ideal e que consideramos o mais apropriado - R$ 1.312,00 - e um outro valor aproximado, desde que mantida a lógica da mudança da tabela do piso salarial. Assim, suponhamos que o governo adote o compromisso de pagar agora o piso de R$ 1.312,00 para 40 horas, aplicando-se a proporcionalidade para a jornada de 24 horas. Teríamos, assim, a seguinte tabela de piso básico: R$ 787,20 (PEB1), R$ 960,38 (PEB2), R$ 1.171,66 (PEB3) e R$ 1.429,43 (PEB4), etc. Sobre este valor incidiriam as gratificações como biênios, quinquenios, pó-de-giz, etc.
Pra uma proposta assim não precisa formar comissão de negociação: basta fazer os cálculos do impacto e propor para aprovação em assembléia. Querer incorporar gratificações sem explicar o que isso representa é uma forma de ganhar tempo e enrolar a categoria.
Imagine-se que, se incorporarem o VTI e o PCRM ao piso básico dos professores PEB3 que têm até seis anos de casa e que portanto não possuem biênios e quinquênios. O piso básico saltaria de R$ 550,00 para R$ 825,00. Somando-se o pó-de-giz, o salário final subiria de R$ 935,00 para R$ 990,OO Com os descontos de 11% da previdência, o valor líquido subiria de R$ 832,15 para R$ 881,10. Ou seja, um aumento de apenas R$ 49,00 no bolso do professor que ficou 40 dias de greve.
No caso de quem é mais antigo e não tem mais VTI ou PCRM, estaria em jogo a incorporação de biênios e quinquênios. E daí? Vai incorporar e retirar essas conquistas? De que adiantaria isso? Sem falar que a diferenciação dos pisos pelas distintas realidades individuais praticamente anularia uma aplicação coerente do plano de carreira.
Portanto, chega de tergiversar sobre uma matéria de simples entendimento. O que se pretende é a mudança de tabela salarial, aumentando o nosso piso básico em todos os níveis, de acordo com o nosso plano de carreira. Qualquer outra revisão de carreira que fuja deste escopo cheira a enrolação, tentativa de ganhar tempo para não pagar nada agora e jogar qualquer alteração salarial para 2011 e olhe lá. Isso, os educadores já demonstraram desde o dia 08 de abril de 2010 que não vão aceitar.
E se o governo bater o martelo e disser que não vai ceder? Aí, está na hora de pensarmos estratégias que façam o governo mudar de idéia. Por exemplo, grandes mobilizações populares, combinadas com o cerco permanente aos candidatos Aécio, Anastasia e sua base parlamentar de apoio. Isso com a greve mantida, com as escolas paradas, com os pais de alunos cobrando do governo (e não dos professores) um desfecho para a nossa luta. Pode chegar o momento em que ou governo negocia os nossos termos. Ou cai.
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